Serviços pessoais: um em cada quatro trabalhadores regulares já é conta própria

03/05/2013 07:27

 

Bianca Torres, manicure de 35 anos, nunca pensou em ter um trabalho com carteira assinada, regido pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Nem quando sofreu uma fratura no joelho e o registro, que lhe garantiria um afastamento remunerado, fez falta. Há seis meses, em busca de segurança, Bianca decidiu contribuir para a Previdência por conta própria.

“Eu sempre trabalhei como autônoma por opção. Com registro em carteira, pagam muito pouco”, diz a profissional, que presta serviço em um salão de beleza em São Bernardo do Campo, na região metropolitana de São Paulo. “[Ter registro em carteira] representa segurança, mas [não é possível]. O jeito é pagar o INSS por conta.”

Profissões como a de Bianca têm impulsionado um fenômeno singular no mercado de trabalho brasileiro nesta década. Em tais atividades, classificadas como “serviços pessoais, coletivos e sociais” pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os trabalhadores têm procurado menos a carteira de trabalho para se formalizar. Por outro lado, buscam cada vez mais trabalhar por conta própria e contribuir para a Previdência, aponta um levantamento feito pelo iG nos números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), do IBGE.

Os números também sugerem que a mesma dinâmica parece estar presente, embora em muito menor escala, na construção civil, como mostra esta reportagem – a última da série sobre os 70 anos da CLT produzida pelo iG .

No levantamento, foram considerados formais os empregados com carteira assinada (incluindo domésticos), militares, servidores públicos e trabalhadores e empregadores por conta própria que contribuem para a Previdência, conforme critério da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No conjunto, eles representam aproximadamente 55% dos 93,5 milhões de ocupados no Brasil.

Beleza passa construção

Em 2011, o setor de serviços sociais, coletivos e pessoais ocupava 1,5 milhão de pessoas formalmente. Desses, quase um quarto (23,6%) era trabalhador por conta própria. O número representa um salto de nove pontos percentuais em relação a 2006. A carteira assinada ainda responde pela vasta maioria dos formais, 66,4%, mas recuou 6,4 pontos no mesmo período.

O presidente do Sindicato dos Institutos de Beleza e Cabeleireiros de Senhoras do Estado de São Paulo (Sindibeleza-SP), Marcos Tadeu, sugere que a modalidade microempreendedor individual (MEI), criada em 2009 para ajudar a formalizar pequenos negócios, tem sido usada para substituir mão de obra por conta própria no setor, aponta. Os cabeleireiros e prestadores de serviço correlatos respondem por 11% dos MEIs do País.

“O MEI ajuda a tirar um pouco da informalidade, mas as pessoas têm entendido [o modelo] de maneira diferente. Há muitos usando MEIs como profissionais dentro do salão de beleza, e isso está errado”, afirma.

Para Tadeu, o recurso dos salões a trabalhadores por conta própria – MEI ou não – decorre da própria legislação trabalhista.

“A nossa lei é muito dura e antiquada. Foi feita na década de 1940 por Getúlio Vargas. Seria [necessário] mudar a legislação para permitir que o autônomo trabalhe dentro do salão.”

Para além do que considera como rigidez da legislação trabalhista, o assessor econômico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Fábio Pina, atribui o avanço dos trabalhadores por conta própria ao aquecimento econômico.

“O crescimento da economia e do consumo fez com que muita gente vislumbrasse oportunidades. Pessoas que já eram comerciárias decidiram se tornar autônomas.”

Já recurso à mão de obra desses trabalhadores, avalia Pina, é mais comum entre os pequenos empreendedores. Em 2011, 11,5% dos ocupados de maneira formal no comércio e na reparação eram conta própria, pouco acima dos 10% de 2006. No mesmo período, a formalização via carteira de trabalho avançou de 78% para 80,1%.

“É a realidade da pequena empresa: a moça que faz e vende coxinha pode contratar alguém? Na prática, não pode”, diz ele.

Coordenador de Trabalho e Renda do IBGE, Cimar Azeredo avalia que há espaço para o avanço da carteira de trabalho, e que o crescimento da economia estimula esse fenômeno.

"Vamos que o mercado melhore. A carteira vai absorver o conta própria que está aí por falta de opção", diz ele.

Construção

Na construção civil, segundo o levantamento do iG , aproximadamente um em cada oito trabalhadores formais (16,5%) atuavam por conta própria e contribuíam para a Previdência em 2011. A proporção é ligeiramente maior à de 2006 (15%). Nesse intervalo, a proporção de trabalhadores com carteira assinada saiu de 80,1% para 79,3%.

Antônio Donizete abandonou o registro em carteira há cerca de três anos, para ganhar mais. Na última terça-feira (30), era um dos trabalhadores por conta própria que montavam a estrutura da festa do Dia do Trabalho da Força Sindical, a maior do País, em São Paulo.

“Virei autônomo só porque o salário era melhor, mas quero voltar a ter alguma coisa mais fixa e trabalhar com mais calma”, diz ele.

Outro era Carlos Aparecido Rodrigues, que tinha um registro temporário, e atua por conta própria há dois meses. Mas, diferentemente de Donizete e Bianca, Rodrigues nem sequer contribui para a Previdência.

“Estou trabalhando [como autônomo] porque é a alternativa que há agora”, diz ele. “[Ser] CLT é melhor, né? Você tem seus direitos todos certos, registro, INSS.”

FONTE: IG/ECONOMIA (CLIQUE AQUI para redirecionar)

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